23 janeiro 2009

A má vontade que move o mundo

Ontem fui ao supermercado Multi Market, no Rio de Janeiro, esquina das ruas Uruguai e Conde de Bonfim. Duas geladeiras de sorvete Kibon. Na da esquerda, o anúncio: “sorvete Kibon 2 litros R$ 10,90”. Dentro dela, os sabores de sempre: creme, chocolate, flocos, napolitano. Na da direita, flocos, napolitano, brigadeiro, Diamante Negro e Sonho de Valsa. Estes dois últimos tinham preços separados, mais caros, marcados junto a eles. Então, para me ater à promoção, peguei o de brigadeiro.

Chegando ao caixa às 22:11 h, brigadeiro custava R$ 11,90. Perguntei à Operadora Roberta por que ali eram R$ 11,90 se, na geladeira, eram R$ 10,90. Ela veio com o caô de que brigadeiro era mais caro e que o preço anunciado era só para os outros. Retruquei que não: que ele estava sem preço e, portanto, o preço mais baixo valia para ele também.

A operadora chamou a supervisora, que, primeiro, confirmou a uniformidade de preços. Mesmo assim, por insistência da maldita operadora (como se fosse ganhar comissão em cima de 1 real), a supervisora foi até a geladeira. Vi que ela procurava um preço diferenciado para o brigadeiro, sem sucesso. Voltou devagar, certamente pensando em algum jeito de sacanear o consumidor. Chegou dizendo que, como o brigadeiro estava na geladeira da direita, o preço de R$ 10,90 não valia para ele.

Eu poderia ter argumentado que (1) outros, para os quais os R$ 10,90 valiam na geladeira da esquerda, estavam na da direita também, o que não mudava seu preço; que (2) brigadeiro estava sem preço, então o cliente tem que adivinhar quanto é?; e que (3) brigadeiro sem preço, anúncio de Kibon 2 litros sem especificar sabor, é óbvio que o preço do anúncio vale para brigadeiro também.

Mas eu não disse nada disso. Só a encarei firme e disse, “então vamos fazer o seguinte. Por causa de 1 real, vamos estornar R$ 11,90. Tá bom pra você?”

Ela fez sem discutir, mas, no caminho pra casa, fiquei pensando que havia feito muito pouco. Eu devia ter simplesmente largado tudo mais em cima do balcão e ido embora sem levar nada. Afinal, se eles estão de sacanagem, também eu devia estar. Devia ter largado tudo ali em cima, só para terem o trabalho de guardar tudo de novo. É verdade que, em vez de me vingar em cima da empresa, eu estaria me vingando em cima dos empregados, mas foram os empregados que me trataram mal, com antipatia e criatividade em me aborrecer.

Pensei mais: que esse é o comportamento de todas as empresas que lidam com consumidores no Brasil. Presume-se que o consumidor (jamais cliente) esteja errado, procuram-se formas de aborrecê-lo, abusa-se da desvantagem logística da pessoa física. Por acaso vai falir o Multi Market se, uma vez só, admitirem o erro e me deixarem levar o sorvete pelo preço que me prometeram? Vai CAIR A MÃO se tirar um reÁU do preço final? Faltava menos de uma hora para fechar o mercado, ninguém mais ia levar sorvete em dia de chuva forte, era só explicitar o preço diferente na manhã seguinte. Mas não: por preguiça, por aleivosia, por espírito emulativo, só o que lhes ocorreu foi estimular mais um pouco a reação de Michael Douglas em Um Dia de Fúria.

Compare com as práticas da Amazon.com. Um livro demorou 61 dias para chegar. Escrevi reclamando, e simplesmente mandaram outro. Acabaram chegando dois e perguntei-lhes se queriam o segundo de volta. Recusaram e sugeriram que eu o doasse a uma biblioteca pública.

Sei que estou levantando muito o sarrafo da comparação. Mas ilegalidades como a do Multi Market se repetem todos os dias com cada um de nós, várias vezes por dia, neste País abençoado onde o Direito do consumidor só existe no papel. Quando aprendo formas de combater esses pequenos massacres, constato que não há relações jurídicas, mas apenas relações de poder. As reações são sempre retaliaçõezinhas, como vir aqui escrever isto ou negociar, na hora, quem sai perdendo mais: eu, R$ 1, ou eles, R$ 41 (se bem que essa é uma batalha que já começa perdida, porque as empregadas não sabem fazer conta e, pior, não se importam. Nem se importa a empresa, principal interessada: se eu não levar, algum favelado leva mesmo).

“Mas, Atoz, por que você não procurou o gerente?” Arrã. O Multi Market já deixara evidente a sua posição. Você sinceramente acredita que, em um supermercado com essa conduta de preços e essa negligência em expô-los,o gerente vai ficar do meu lado em vez de sustentar a história de operadora e supervisora de caixa?

Agora, o que o Multi Market ganha com isso? Ganha que vou passar a ir mais vezes ao Extra, ao Ultra, à Sendas, ao Campeão, ao Tijuquinha e às padarias da região. Eles jogaram fora uma excelente oportunidade de conquistar um cliente. Bastaria estornar, lançar o valor correto e pronto, o cliente satisfeito tende a voltar. Veja o Hortifruti, por exemplo. Se compro um pão no Hortifruti e o pão mofa antes da validade, basta procurá-los com a nota fiscal que eles trocam sem fazer perguntas. Com isso, mesmo o Hortifruti sendo mais caro, eu tenho a tendência de ir comprar lá.

O Multi Market mantém aquela atitude antiga dos comerciantes brasileiros: de que o comércio é uma guerra contra o consumidor, onde o mercado tem que fazer tudo a seu alcance para levar as menores vantagens em tudo. A visão embotada não enxerga que, abrindo mão de R$ 1 que não é dele, o mercado ganharia R$ 41 de mim.

Praga de Atoz surte efeito. Eu sinceramente desejo que aquelas duas percam seus empregos e morram sentindo dores e que o amaldiçoado Multi Market acabe fechando.

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20 janeiro 2009

Saindo do berço

Quatro coisas.

Aqui no Rio de Janeiro, a posse do Obama foi tão importante que o prefeito decretou feriado. Ninguém trabalhou.

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Você nunca quis saber quem fazia os uniformes dos supervilões? Então. A resposta está em Flash Comics #155 (setembro de 1965): “O desafio dos supervilões!”, publicada no Brasil em Coleção DC 70 anos no. 4 (agosto de 2008). Quando o Mestre dos Espelhos foge da prisão, acompanhamos seus pensamentos:

“Com certeza serei apanhado num pulo com estes trapos da prisão! Tenho que conseguir uma roupa nova! E sei exatamente onde!

“Logo, numa região sórdida da cidade...

“Lá está! O alfaiate que costumava fazer fantasias pra supervilões foi trancafiado pela polícia! Mas soube pelos rumores que seu aprendiz, chamado Leach, tinha aberto essa nova loja num lugar diferente!”

Aí está. Agora você sabe.

***

Quando ouvi esta gravação, alguns dias atrás, fiquei emocionado. Adivinhe o que é.

Isso é a digitalização do original feito por dois irmãos radioamadores italianos, que, ao ouvirem falar do lançamento do Sputnik I, montaram um equipamento rude, porém suficiente para passarem o restante da corrida espacial ouvindo todas as comunicações abertas de soviéticos e americanos. Acumularam quilômetros de gravações, entre elas isso que você ouviu: as emissões do primeiro satélite construído pela raça humana, lançado em outubro de 1957. Preservadas em meio digital, evocaram-me tudo que já li sobre a Era Espacial e seus efeitos inevitáveis em nosso futuro (parte do qual já é nosso passado). Tão simples, o sinal apenas afirmava que sua fonte estava ali e mais nada, mas, para mim, esse é o som de quando eclodimos o ovo. Nas palavras de Tsiolkovsky, assim começamos a sair do berço.

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Saindo do berço em outro sentido da expressão, este é o primeiro vídeo que subi para o YouTube (se não abrir, tente http://www.youtube.com/v/50pup9L-ES4 ).



Fui eu mesmo que filmei quando fui ao Flying Legends em 12 de julho de 2008. O Flying Legends é um evento anual que acontece em Duxford, Inglaterra, em uma antiga base aérea da RAF (aliás, a primeira base a receber Spitfires, no longínquo 1938). O vídeo mostra a preparação para o encerramento do show, quando decolaram juntos todos os caças da II Guerra Mundial que voaram no evento (primeiro os da Marinha americana, depois os da USAAF e, por último, os Spitfires). Em seguida (mas isto não está nesse filme, só em outro), fizeram um grande Balbo sobre o campo: 26 caças em formação, em uma longa fileira. Vou ver se subo esse outro mais tarde.

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Recém-lida: Green Lantern #31 (setembro de 1964), primeira história.

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18 janeiro 2009

Diário de consumo

Recém-lidos:
As concepções fenomenológicas elementares do Estado e do Direito, de André Ricardo C. Fontes, publicado em Cadernos da Escola da Magistratura Regional Federal da 2a Região - EMARF, v. 1, n. 2 (outubro de 2008-março de 2009);
Superman #164 (outubro de 1963), primeira história;
Superman #167 (fevereiro de 1964).

Recém-visitados:
http://discipulodarazao.com/
http://skeptoid.com/
http://ceticismo.net/

Na caixa acústica:
Carly Simon, Libby, Cow Town e Riverboat Gambler;
Camel, Freefall.

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15 janeiro 2009

Gente que afirma demais e gente que afirma de menos

Quando os líderes sindicais querem mobilizar suas categorias, que fazem? Vão para cima do carro de som e discursam em tom de censura a sua base sindical. Isso mesmo: dirigem palavras agressivas, reprovando seus colegas. É sempre um tom antipático, acompanhado pelo brandir de dedos que acusam os demais trabalhadores por seu predicamento, culpando-os pela postura do empregador.

É verdade que nós, não outrem, somos responsáveis pelo que nos acontece. Mesmo assim, a meu ver não se justifica a animosidade desses sindicalistas contra sua própria base. Se julgam que estão sendo pisoteados e massacrados pelo capital, ora, que se queixem contra o capital, não contra a mão-de-obra. Se o trabalhador está sendo privado de melhores condições, não é por obra de outro trabalhador.

Qual será a reação natural de quem está ao alcance dos alto-falantes? A minha é de querer me afastar. Se alguém fica cobrando alguma coisa de mim onde não estou obrigado, se alguém vai ficar me condenando em tom de dono da verdade sem que eu lhe deva nada, não vou querer ficar amigo dessa pessoa; vou querer é distância. "Você não pode aceitar, você não pode se deixar levar, vocês têm que se levantar, vocês têm que se insurgir." Eu não tenhoquê nada.

Não estou querendo minar o movimento nem justificar apatia. Estou resmungando, isto sim, contra uma hostilidade mal endereçada.

Se muita gente reagir como eu, vai ficar difícil esses caras terem adesão. Ocupam-se tanto de fazer política que se esquecem de ser políticos.

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Às vezes, estou na fila para atendimento em uma sorveteria, ou em uma lanchonete, ou em semelhante comércio. O balconista pergunta a quem está à minha frente.

-- Quer gelo? (ou: "quer cereja?", "ponho calda?", "vai amendoim?", "é com mostarda?")

-- Pode ser.

Como assim, "pode ser"??? Quem está pagando é você! Quem tem o ônus de definir como quer o sanduíche (sorvete, refrigerante) é você! Quando dizem "pode ser", não estão dizendo como querem, mas apenas autorizando o atendente a escolher como ele quiser: se põe ou não põe. Estão permitindo que ele defina, estão dizendo que tanto faz.

Comigo é mais direto. "Sim, por favor" (e o "por favor" só está ali por educação, que favor não é) ou "não, obrigado". Só. Sem essa de "pode ser".

Gente que não se define, não se afirma, não sabe o que quer!

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13 janeiro 2009

Resolvido o problema na faixa de Gaza

Agora está resolvido: diante desta manifestação do presidente de nosso Senado Federal, certamente Israel e o Hamas chegarão a um acordo. Por que ele demorou tanto? Teria evitado centenas de mortes.

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12 janeiro 2009

Papo de maluco

A linha de meu telefone fixo estava cruzada com as de outras pessoas (assim mesmo, no plural). Se eu ligasse para a própria Telemar, ela identificava meu número como outro. Às vezes, eu tirava o fone do gancho e encontrava uma conversa já instalada.

Sábado de manhã, o telefone tocou.

-- Bom dia.

Silêncio.

-- Alô, olá, quem fala?

Entrou uma senhora com sotaque levemente português.

-- Alô. O sinhoire queire falar com quem?

-- Eu? Não, minha senhora, fui eu que atendi. O telefone tocou e eu atendi.

-- Como? O sinhoire ligou e o sinhoire mesmo atendeu?

Tem cada uma!

***

Uma de muitas coisas que odeio é ser chamado de "meu querido". Especialmente por vendedores, balconistas, telemarqueteiros e assemelhados.

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Recém-lidos:
Batman #156 (junho de 1963), segunda história;
Nineteen Eighty-Four, de George Orwell.

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09 janeiro 2009

A paródia é a da própria Paramount

Smallville costuma ser elogiada por seu conteúdo intrínseco, como série. Quanto a sua relação com a mitologia do Super-homem, até hoje só li gente ou neutra ou falando mal. Pelo que leio, há razões para isso; o criador (foge-me o nome) faz muita coisa diferente do que estava estabelecido nos quadrinhos. Exigências do formato, que alguns fãs não vêem (pré-acordo ortográfico) como adaptação, mas como desrespeito.


Agora, Star Trek, o novo filme. Quando o primeiro trailer estreou, falei bem à beça, e ainda falo. É um trailer para os fãs da antiga. Respeitoso, com o tema de espaço, a música da série, a voz do Nimoy, e a homenagem à nave como símbolo das conquistas humanas.


E sai o segundo trailer. Uma b*sta. É igual a todos os insuportáveis trailers de filmes de ação: 24 fotogramas piscantes por segundo, todos de cenas diferentes, pra você nem conseguir identificar o que viu. Parece que eles se esforçam para a audiência ter ataques epilépticos. E tambores, tambores, tambores, explosões, correria, tiros faiscantes. Uma m***a.


Veja só: não estou falando mal do filme, mas do trailer. Pelo que já li e vi, entendo que o filme não terá compromisso com o cânone, mas não espero esse compromisso. Ao contrário, há tempos vêm declarando que é reboot na franquia, começa tudo de novo, tal como a Galactica de agora. Então, vão falar mal, dizer que ele não respeita a tradição, mas a proposta não é mesmo de respeitar a tradição.


Percebe como a queixa é parecida com a de Smallville? Então. Alguém percebeu antes. Dá só uma sacada neste vídeo genial (mas só depois de ver o segundo trailer acima).


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Gente que merece

A pacamanca indicou, eu repito. O saite é muito engraçado.

Os três linques com que mais concordei até agora (e nem são os mais engraçados):

http://peoplewhodeserveit.com/2008/11/08/29-douche-who-wear-sunglasses-inside/

http://peoplewhodeserveit.com/2008/11/14/34-slow-walker-sidewalk-blocker/

http://peoplewhodeserveit.com/2008/12/12/55-no-umbrella-etiquette-lady/

08 janeiro 2009

Dedicação de fã

Eu tenho que dividir isto com vocês.

Foram tantos pedidos que o cara montou este papel de parede também.

O que um fã não faz. É de cair pra trás. Com e sem rima. Observem que até os Thundercats e Watchmen estão ali. (Aliás oportuno para o filme.)

Falar em Thundercats, o Alexandre Maron também indicou um trailer feito por fã, com muito tempo e dedicação, para um suposto (e inexistente) filme deles. Dugarai. Comentário que deixei por lá:

"Ué, não entendi. Thundera é Praxis?

"Brincadeira. E eu achei o Tygra bem feito.

"“An ancient evil rises.” Caraca, mais clichê do que isso impossível. Como minha Digníssima gosta de comentar (e eu com ela): “são os antigos”. Pode ver: até quando você recua à época do Conan, ou de Çatalhöyük, sempre tem os carinhas que já eram antigos."

BOMBÁSTICO!

Parem as rotativas!!!

Acaba de sair notícia no TheOnion: foi encontrado um erro na Internet!

A reportagem denuncia um fato gravíssimo: está manchada a reputação da Internet como fonte incontestável de pesquisa. Uma usuária descobriu um erro em uma página sobre determinado seriado. Alguns especialistas reconhecem a possibilidade de que a informação encontrada na Internet possa ter sua veracidade comprometida. Advertem: já não podemos confiar em tudo que lemos na Rede.

Recém-lidas:
Adventure Comics #271 (abril de 1960), primeira história;
Superboy #86 (janeiro de 1961), terceira história;
Green Lantern #17 (dezembro de 1962), assim finalizando Showcase Presents: Green Lantern v. 1, de John Broome et alii;

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01 janeiro 2009

Pra ficar orgulhoso? Ou preocupado?

Falando em Jonathan Woodward, estive no belogue dele agora há pouco. Ele indica um teste de conhecimento sobre as instituições políticas dos Estados Unidos, mantido pelo Intercollegiate Studies Institute. São 33 perguntas de múltipla escolha, que ele diz ter gabaritado. Diz, ainda, que o americano médio acerta 49% no teste.

Só de farra -- e também porque parece que eu sou competitivo em matérias como essa --, fiz o teste. São perguntas simplinhas, sobre fundamentos da História das instituições políticas dos Estados Unidos. Você consegue responder algumas coisas com base no que vê nos filmes.

Pois bem. Acertei 76%.

É pra ficar orgulhoso ou preocupado? O resultado mostra o quanto somos aculturados abaixo do Equador. E, se superei o americano médio em matéria das instituições políticas deles, fico pensando: essa é a mesma nação cuja suposta crise (crise de cuja existência duvido) está supostamente afetando a economia mundial, e que se mete em tudo quanto é buraco dizendo trazer a democracia.

(Sim, eu sei que o Secretário de Estado não é o cidadão médio. Não fuja do assunto.)

Então, deixei-lhe este comentário.

"Jon, I am worried. I am Brazilian. Have always lived in Brazil. Yet I scored 76% on the test. Granted, I am a lawyer and Brazilian constitutional Law is mostly a copy of American constitutional Law, so we end up studying the foundings and whys of your Constitution. Still!

"And yes, I would vote for you, on other grounds: you are a scifi fan, a comics fan, and literate. This should suffice in this day and age! :) (...)

"BTW, still love your Crisis on I. Earth pages! Have you noticed that Marv Wolfman links to them on his main blog page? Way to go, man!"

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30 dezembro 2008

Homenagem maior não há

Existe um escritor de quadrinhos chamado Marv Wolfman. Junto com o desenhista George Pérez, Wolfman foi o criador de uma série em doze capítulos publicada pela DC Comics em 1985 e chamada Crise nas Infinitas Terras. Passados 23 anos, essa série ainda é unanimemente reconhecida como o momento de maior impacto em todos os títulos da editora. Com todos os defeitos que lhe atribuem, os leitores ainda a comentam, ainda a analisam, ainda a tomam como referência.

Existe um website que é uma referência valiosa sobre a Crise. Chama-se The Annotated Crisis on Infinite Earths, é mantido por Jonathan Woodward e disseca as edições da série, esclarecendo referências e comparando passagens.

Dia desses, eu estava lendo o belogue de Wolfman quando vi que ali havia um linque para a Annotated Crisis. De um ponto de vista objetivo, trata-se de um Autor apontando para uma obra de referência útil para se ler a dele próprio, o que beneficia a divulgação dessa obra e, portanto, do artista.

Mas a primeira leitura que fiz foi outra. Coloque-se no lugar de Woodward: o criador da obra comentada está mostrando seu reconhecimento pela qualidade do trabalho do comentarista. Está dizendo: em toda a Internet, não há maior (ou melhor) autoridade sobre o que eu fiz do que este sujeito.

Eu não conheço homenagem maior. Se Woodward souber disso, estará plenamente justificado em se sentir o máximo.

Recém-lida: Superman #90 (junho de 1954), terceira história.

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29 dezembro 2008

Intimações do Ministério Público da Justiça

Eu ia escrever sobre outra coisa hoje, mas fica para amanhã. Hoje quero comentar um spam recebido por meu colega Ismaga (não é seu verdadeiro nome).

Começa dizendo que é intimação. Neste país de otoridades e abusos, intimação assusta qualquer um. Aí, o remetente se identifica como "Procuradoria Regional da Justiça".

Vamos analisar:

1 - Se é de Justiça, já é estadual, então nunca teria o nome de "Regional".
2 - "Da" Justiça não: "de" Justiça. O idiota que escreveu não sabe a diferença, pra ele é tudo Justiça, Poder Judiciário, otoridade. Mas Ministério Público nunca é "da" Justiça. Só pra você saber: a justiça do nome das procuradorias não é o Poder Judiciário ("a" Justiça), mas o valor moral, sem artigo. Procurador = pro curador, ou seja, alguém a favor de tomar os cuidados com. Eles cuidam da justiça, é o que diz o nome.

Em outras versões, o texto diz que é do "Ministério Público da Justiça" -- órgão que, aliás, NÃO EXISTE.

O texto prossegue, dizendo ser do Ministério Público do Trabalho e exigindo seu comparecimento a depor em Brasília.

Continuemos:

3 - Ministério Público estadual ou do Trabalho? Se é Procuradoria de Justiça, é estadual.
4 - Brasília??? Mas a Procuradoria era Regional. E como é que Ismaga, estando no Rio, seria chamado a depor em Brasília? Pra isso eles mandam carta precatória, e o procurador daqui é que te ouve, não o de lá.

Diz o email que tem fundamento nos artigos 137 e 119, VI, da Constituição federal.

Prossigamos:

5 - O artigo 137 versa sobre estado de sítio. BASTA OLHAR. Será que o Ministério Público quer ouvir Ismaga antes de pedir ao presidente da República que decrete estado de sítio?
6 - O artigo 119 versa sobre Justiça Eleitoral, não do Trabalho. E não tem inciso VI; pára no II.

Finalmente, quando o assunto é sério, o Poder Público NUNCA manda email. É sempre pelo correio ou até pessoalmente. Pela simples razão de que a mentalidade ainda é a do papel.

Claro que termina dizendo "clique aqui".

E tem também aqueles emails onde um banco supostamente ameaça tirar seu acesso à Internet (sim, isso mesmo: você vai ser desconectado), todos escritos em miguxês. Essa é uma fraude primária, em que já não cai uma criança de três anos. Ainda mais que, quando você desliza o mouse em cima do "clique aqui", aparece o endereçamento real: saites obscuros e escusos de roubo de senha. Normalmente eu recebo esses de bancos onde não tenho conta, então estou ca*ando se eles tirarem meu Internet banking.

Se alguém ainda cai, e depois tem sua senha roubada, sinceramente, eu acho que é BEM FEITO. Bem feito pela preguiça de pensar, pela ignorância voluntária, por achar que comparecimentos a audiências se resolvem com um mero clique -- preguiça de ir até lá também --, por serem analfabetos no uso da Internet, que não é para crianças.

Recém-lidas:
Action Comics #23 (abril de 1940), primeira história;
Green Lantern #16 (outubro de 1962).

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23 dezembro 2008

Quem vigia os vigilantes

Fui ver Body of Lies (Rede de Mentiras) no sábado. Fiquei decepcionado. Eu esperava que fosse uma história onde todo o mundo mentisse para todo o mundo, onde não se pudesse confiar em ninguém, onde o DiCaprio fosse traído justo quando estivesse no meio da lama e depois tivesse que se virar sozinho -- e não foi nada disso. Bem, foi um pouco disso, mas pouco. Permita-me colocar do seguinte modo: eu esperava certos clichés conforme os últimos quinze anos de cinema nos têm levado a esperar, mas os clichés foram os de cinqüenta anos atrás (oito dias para a queda do trema, e contando). -- [Apidêite em 07/01/2009: a versão original desta mensagem dizia "queda da crase". É que eu sou tão obcecado com crase que confundi as inguinoranças. Foi mal aí.]

Também esperava mais helicópteros, várias cenas de helicópteros, como sugeria o trailer -- e só teve uma. Além disso, o mocinho cometeu um erro grave e tinha que pagar por ele, mas, mesmo assim, acabou sendo ajudado quando não merecia. Estou profundamente decepcionado. Se soubesse, não teria pago os R$ 17 do ingresso no Cinemark. O lado bom foi ter tido a oportunidade de escolher lugar, já marcado antes de entrar, igual a avião.

O lado ainda melhor foi o que veio antes do filme: trailer de Watchmen! Assim que apareceu a primeira cena, antes de o Dr. Manhattan explodir em pedacinhos, eu já tinha reconhecido que era ele. Está muito igual ao quadrinho! Várias cenas estão perfeitamente reconhecíveis! O clima está igual ao do original! Os personagens estão iguais! Maneiríssimo! Tenho que ir ver! Urru!

Recém-lida: Green Lantern #15 (setembro de 1962).

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22 dezembro 2008

Resmungo sortido de Natal (4): diplomas escusos

Voltando à filipeta que já comentei aqui, tem mais uma coisa. Dizia ali que a academia estava sob a responsabilidade de uma certa profissional, “Dra. Fulana de Tal -- formada em Educação Física, especializada em...”. Peraí. Formada onde? Só diz em quê. Se a faculdade fosse boa (ou, pelo menos, conhecida), ela diria qual foi. A conclusão que tiro é que a “doutora” tenha se formado em alguma faculdade obscura, cujo nome prefere esconder por vergonha. Então, seu anúncio funcionou ao contrário: ali é que não quero mais ir.

Recém-lida: Green Lantern #14 (julho de 1962).

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19 dezembro 2008

Resmungo sortido de Natal (3): metodologias

Sem sacanagem: o que significa a palavra metodologia? Logia, logos, discurso. Então, metodologia é o discurso, o estudo, a ciência que estuda o método. Você pega um método e começa a analisá-lo, interpretá-lo, avaliá-lo. Essa atividade é a metodologia.

Quando você está descrevendo um método a alguém, você está descrevendo o método, não a metodologia. Metodologia é o que você faz, é o que você está fazendo; método é a coisa que você está expondo, explicando, é a coisa que você está trazendo.

Estou de saco cheio dos acadêmicos tecnocratas cujas monografias começam com o seguinte resumo: “... expondo uma metodologia de classificação da produção tecnológica...”. Não. Vampará com isso. O que está sendo exposto é o método de classificação, não a metodologia. As frases estão sendo alongadas desnecessariamente.

Mais um centavo para o Tal Shiar.

Recém-lida: Green Lantern # 13 (junho de 1962).

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18 dezembro 2008

Resmungo sortido de Natal (2): neogramática

Existem algumas campanhas por aí, “doe dinheiro para o abrigo dos cegos”, “faça uma doação para as vítimas da enchente”, “clique aqui e doe um prato de comida”.

Pois pode escrever aí: a partir de agora, pra cada crase proibida que eu encontrar, cada há-do-verbo-haver que eu encontrar escrito como “à”, cada vírgula entre sujeito e verbo, cada erro de concordância com que eu me deparar, vou doar um centavo pràlguma ditadura bem maligna, ou pros fundamentalistas islâmicos, pro IRA, pro Tal Shiar, sei lá pra quem. Eles vão ficar milionários.

Recém-lida: Green Lantern #12 (abril de 1962).

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16 dezembro 2008

Resmungo sortido de Natal (1): o trem do Inferno

Qualquer um que ande de metrô no Rio de Janeiro sabe o suplício que é. Um aperto desgraçado, você não consegue entrar no vagão. Outro dia, quando cheguei ao Estácio e aquele mundo de gente saiu por um lado, pelo outro entrou uma moça que quase caiu pra trás com -- palavras dela -- o cheiro de suor que havia ficado no ambiente. Verdade. Até eu, que estivera imerso ali, estava sentindo.

Outro detalhe curioso é a quantidade de retardados que reclama que “o ar está desligado” (ou o equivalente: “está só na ventilação”). É incrível. O vagão foi projetado para levar, sei lá, oitenta pessoas, mas está levando, digamos, duzentas. O imbecil realmente espera que fique geladinho do mesmo jeito. Não percebe que, se ele ainda não morreu sufocado, é que o ar está ligado. Não percebe um ventinho que percorre sua cabeça, mais frio do que a sauna à sua volta. No cérebro de ervilha do hipoplausibilóide, ele está sentindo calor, portanto o ar está desligado. Dá vontade de ligar uma bomba de vácuo na boca do desgraçado e perguntar se o ar já foi ligado ou se está só na ventilação.

Enquanto isso, em cada uma das estações, vários cartazes mostram modelos sorridentes sob slogans do gênero “Metrô Rio. A vida é melhor aqui”, mais conforto, mais feliz, orgânico e sustentável. Estou convencido de que esses cartazes têm a única serventia de debochar do cliente.

Pois, não bastasse tudo isso, na estação Saenz Peña, nesse último sábado, um barulho infernal veio somar-se à tortura apavorante. Uma TV de LCD e umas caixas de som faziam propaganda da Sky exibindo um videoclip de soul music, enquanto um par de cadeiras de plástico supostamente servia como ponto de vendas, aliás desocupado. O som estava altíssimo, tomava todo o ambiente, deslocava meus pensamentos, martelava pessoas e mobília.

Será possível que a Sky realmente acredite que, torturando meus ouvidos, vá me convencer a comprar algum pacote? Se alguém me faz mal, não vou querer negociar com aquela pessoa; vou querer é distância dela. Mas fui advertido por quem estava comigo: os imbecis só se sentem confortáveis quando há barulho alto. Então, para a maioria dos imbecis (e para a infeliz que, depois eu vi, chegou para ocupar aquele posto), o barulho é agradável.

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10 dezembro 2008

Privacidade na Internet

Preciso mandar um email pra um colega do curso de Engenharia, o [name withheld by Blogger for privacy]. Joguei o nome dele no Google, joguei partes do nome, acrescentei o nome da companhia onde ele trabalha, joguei o nome e a especialidade do pai dele (vai que consigo mandar email para o pai dele redirecionar), tudo sem sucesso.

Achei-o no LinkedIn. Só que, para mandar mensagem para ele pelo LinkedIn (que não mostra o email), tenho que pagar US$ 30 de anuidade ao LinkedIn.

Até que encontrei o 123people, um saite onde você digita um nome e ele mostra tudo que achou vinculado àquele nome: belogues, comentários em belogues, mensagens no ICQ, vídeos, páginas da Web, ... Uma espécie de "Google de pessoas", mais específico. Nem assim adiantou.

Taí um cara que sabe preservar sua privacidade na Web. Não é coisa fácil por estes dias.

Mas o 123people mostrou que a Amazon tem uma wishlist do meu colega. Felizmente, alguns livros que ele quer são livros que li (ou estou lendo) e que recomendo: 1984, Fahrenheit 451, Admirável mundo novo. Então, que fiz? Comprei-lhe Fahrenheit 451 e pedi que a Amazon colocasse um recado junto com o presente, recado no qual consta meu email. Custou só US$ 17, que a informação de que preciso vale para mim. E ainda avisei que tenho um exemplar sobrando de 1984 (edição americana, não britânica como a que estou lendo), que não preciso comprar da Amazon.

Então, olha só que legal: paguei $17 em vez de $30 e ainda vou deixar meu colega feliz. E ele não precisa me dizer o email dele.

Essa foi a boa notícia de hoje.

Recém-lidas:
Green Lantern #8 (outubro de 1961);
Green Lantern #9 (dezembro de 1961).

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